Antônio Maspoli de Araújo Gomes [1]
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“Pra entender a asserção de Rabi Shimon, devemos observar sua ênfase: ’não encontrei nada melhor para o (corpo do) homem do que o silêncio’; para assuntos relativos ao corpo, para temas físicos, quanto menos conversa, melhor”.
(BUNIN, 1998, pp. 62)
Resumo: esta pesquisa busca explicitar as representações sociais sobre o corpo e a sexualidade veiculadas no protestantismo, através da literatura publicada sobre este tema para o consumo dos membros de Igrejas. Inicialmente foram traçados dois objetivos para este trabalho: a) Explicitar as representações sobre o corpo e a sexualidade na patrística bem como no protestantismo de Martinho Lutero e João Calvino.
PALAVRAS-CHAVE: Protestantismo, corpo, sexualidade.
ABSTRACT: This research intended to clarify the social features on the body and sexuality linked to Protestantism, as viewed in the literature already published on this matter, for the use of church members. Primarily, two goals were established for this academic research. Firstly, it intends to demonstrate the features on the body and sexuality according to the patristic thought as well as in the Protestantism, represented by Luther and Calvin’s thought.
Key Words: Protestantism, Body, Sexuality.

  1. Introdução

O corpo humano é construído socialmente e historicamente determinado: Tem uma história e conta uma história. A história do corpo confunde-se com a história da filogênese humana, isto é; com a história do desenvolvimento da espécie. E reflete, de certo modo, a história social da humanidade. Neste sentido, repercute, também sobre o corpo, as contribuições das representações sociais construídas a partir das crenças e idéias religiosas. Esta assertiva é absolutamente válida quanto às representações do corpo no cristianismo as quais foram edificadas a partir da teologia cristã. Já, a história contada pelo corpo, na ontogênese, no desenvolvimento do indivíduo, reproduz de certo modo, a história da filogênese e incorpora o repertório de representações coletivas oriundas de uma determinada cultura num determinado intervalo de tempo, isto é; o corpo é histórico. Ele carrega consigo, na história do corpo individual, de um determinado indivíduo, a história do corpo da humanidade, do corpo da espécie. Esta afirmação torna-se válida também quanto à sexualidade humana. O homem exerce a sexualidade num espaço de tempo determinado atravessado pela economia, a política, teologia e, em certo sentido, pela religião. Estes fatores combinados determinam suas crenças sobre o corpo humano e sua práxis sexual.
O tema do corpo no cristianismo protestante tem despertado pouco interesse dos pesquisadores no Brasil. Aqueles que pesquisam este assunto ainda são, em sua maioria, ligados às denominações protestantes, e por esta razão, dedicam seus estudos mais aos verbetes da enciclopédia teológica do que propriamente a formulação de uma teologia do corpo. Uma teologia do corpo parece não encontrar lugar nesta enciclopédia. E a tentativa de inserir o corpo nas pesquisas teológicas ocorre pela via da teologia adjetivada, da teologia pastoral. No protestantismo brasileiro, a teologia prática reflete a práxis do pastor e vincula-se a tradição denominacional e ao discurso oficial de uma determinada confissão protestante.  Isto, certamente, contribui para desestimular os estudos e pesquisas sobre o corpo e a sexualidade. Estas considerações trazem algumas questões à baila para reflexão: Quais as origens cristãs das representações do corpo e da sexualidade na Igreja Primitiva? De que forma o corpo e a sexualidade foram representados pelos pais da Igreja? Que lugar ocupa o corpo e a sexualidade na produção editorial veiculada na comunidade evangélica brasileira? Que relação existe entre as representações sobre o corpo e a sexualidade no protestantismo brasileiro com aquelas da teologia clássica do protestantismo? De que forma estas representações podem incluir as representações oriundas da cultura brasileira? Quais as implicações das representações sobre e o corpo e a sexualidade sobre a consciência individual? Quais as implicações das representações sobre e o corpo e a sexualidade sobre a saúde mental?
O termo representações sociais, neste trabalho, será utilizado na mesma acepção dada por DURKHIEM (1989), MOCOVICI (1978) JODELET(1984), e BERGER (1985), isto é, aquelas representações coletivas geradas pelas crenças de um determinado grupo, no contexto de uma cultura, e que servem para organizar o conhecimento do senso comum responsável pela dinâmica da vida cotidiana. Tais representações podem ser geradas pelas crenças religiosas, pelas crenças científicas, através da mídia, por meio da empresa, por intermédio da  família e até nas relações face to face. Nesta pesquisa traba0lharemos com aquelas representações veiculadas nos livros sobre o corpo e a sexualidade que circulam no protestantismo brasileiro.
Destacamos, neste trabalho, as contribuições para o estudo do corpo e da sexualidade, numa perspectiva protestante, dos pesquisadores LOTUFO JÚNIOR(1985), Corpo e dimensão espiritual; VELASQUES FILHO( 1985) Sobre comportamento protestante; MARASCHIN(1985) Fragmentos, harmonias e dissonâncias do corpo; ROSA(1985), Religião e sexualidade e; mais recentemente, o trabalho de CAVALCANTI ( 1992)  Libertação e Sexualidade.
Inicialmente, foram traçados dois objetivos para este trabalho: a) Explicitar as representações sobre o corpo e a sexualidade na patrística bem como no protestantismo de Martinho Lutero e João Calvino e; b) Demonstrar como as representações do corpo e da sexualidade têm sido representadas na produção editorial e acadêmica sobre este tema no protestantismo brasileiro, especialmente na Pedagogia Sexual do Protestantismo.

  1. O Corpo nas Representações dos Pais da Igreja do I ao IV Século

VERNANT ( 2002) apresenta o corpo do cidadão grego como legítimo representante do ideal da virtude que traduzia, na beleza das formas perfeitas, o sentimento produzido pela alhetéia, a verdade revelada pela natureza. O corpo grego era considerado o principal instrumento de construção e defesa da polis e por esta razão, deveria ser modelado pela prática dos esportes e pela arte da guerra. Este corpo, todavia, era considerado neutro em relação à sexualidade posto que o homem grego não conhecia o conceito de pecado sexual tal como formulado pela teologia cristã. Com algumas modificações, as representações sobre o corpo na sociedade grega foram incorporadas pelo Império Romano.
A conversão do corpo helênico, moldado nos padrões de beleza grego romano, no corpo judaico cristão, obedeceu a um longo processo de transformação que durou mais de quatro séculos, do século I ao IV século d.C. O historiador BROWN,( 1990) realizou um mapeamento desta transformação utilizando como pedra de toque o que ele denominou de princípio da renúncia sexual permanente – a continência, o celibato e a virgindade perene – que se desenvolveu nos círculos cristãos deste período.
O corpo no cristianismo século I é marcado por dois fatores: a esperança escatológica dos primeiros cristãos e a teologia do Apóstolo Paulo. Os cristãos aguardavam a segunda vinda de Cristo com a conseqüente manifestação visível do reino de Deus. Esta esperança messiânica compungiu-os a deixar tudo: bens, família, trabalhos, lazer e etc. Em virtude de viveram a expectativa da parussia: a volta triunfante de Cristo. Outro aspecto que marcou o imaginário cristão reporta-se a teologia paulina sobre o corpo.  Paulo apresenta o corpo como um objeto paradoxal. Se por um lado o corpo é alçado à condição de templo do Espírito Santo, por outro, é marcado pela carne, a natureza adâmica decaída. Esse dualismo Paulino moldou o pensamento da patrística e reverbera até hoje nas imagens que o protestantismo cunhou sobre este tema. São Paulo: “ Eu sei que o bem não mora em mim, isto é, na minha carne. Pois o querer o bem está ao meu alcance, não, porém o praticá-lo. (…) Infeliz de mim! Quem me libertará deste corpo de morte?  Graças seja dada a Deus por Jesus Cristo Senhor nosso.”( S. PAULO Romanos, capítulo 7:18; 25) O grande problema sobre o qual se debruçaram os exegetas da Igreja Primitiva foi definir o que significava carne neste paço das Sagradas Escrituras. Para alguns, que seguiam a interpretação literal, a carne significa o corpo humano, para outros, que utilizavam a interpretação metafórica, a carne bem poderia significar a natureza humana decaída. Até Santo Agostinho, no século IV prevaleceu a interpretação literal na qual a carne estava identificada com o corpo humano.  Somente a partir da exegese realizada por Agostinho e dos teólogos que o sucederem a palavra carne que aparece em Romanos( S. PAULO, capítulo 7:5; 14; 18; 28)  recebeu a conotação de natureza humana. No entanto, o problema da maldade da carne apontada por Paulo neste texto ainda não estava resolvida: o corpo está incluído na natureza humana pecaminosa. A interpretação corrente no universo protestante afirma que aqui aparece uma antítese entre o espírito e a carne. O espírito humano estaria ligado as suas origens celestiais e o corpo humano umbilicalmente preso as suas origens terrestres conforme Gênesis: “Então Iaweh Deus modelou o homem com argila do solo, insuflou em suas narinas o hálito da vida, e o homem se tornou um ser alma vivente.” (GÊNESIS, capítulo 2:7)
Por outro lado, a carne em Paulo, foi cumulada de uma superambundância de noções superpostas, tornando-se cada vez mais complexa à compreensão do homem comum, do senso comum, que fora atraído pelo cristianismo. A imagem carregada de sua linguagem confrontou todas as eras posteriores como um teste projetivo: é possível aquilatar, na exegese repetida de uma simples centenas de palavras das epístolas de Paulo, o rumo futuro do pensamento cristão sobre a pessoa humana. Na época, Paulo reuniu associações que um pensador menos impetuoso talvez mantivesse separadas. A guerra do espírito contra a carne e da carne contra o espírito, no pensamento do Apóstolo, expressando a imagem da resistência humana à vontade de Deus, da desobediência de Adão e Eva. Paulo não postulava o corpo humano em si como causa única desse mal tão terrível. A causa encontrava-se na natureza humana decaída do casal primevo. Convém lembrar que Paulo era um mestre instruído, tendo sido reconhecido como Rabi, antes da sua conversão e seu encontro pessoal com o Cristo na Estrada de Damasco tal como consta do relato em Atos Capítulo. (S. LUCAS  Atos do Espírito Santo através dos Apóstolos, capítulo 9).
Qualquer que fosse sua causa, o doloroso conflito entre o corpo e a alma, era uma realidade da vida-muitos dos pecados que lhe eram mais repugnantes – em particular, a luxúria, como expressão de uma sexualidade desregrada e a embriaguez – provinham, obviamente, da rendição às exigências do corpo. Esses pecados não esgotavam a sua complexa idéia da carne. Por mais que a teologia cristã queira abrandar o pensamento de Paulo sobre o corpo, como o fez Karl Barth em seu Comentário aos Romanos, o corpo Paulino já havia sido estigmatizado pela Igreja como habitação da maldade humana. Karl Barth: “Lembremos-nos o que ‘a carne’ significa: mundanalidade desqualificada; (vista justamente pela criatura religiosa) carne é a definitiva e inqualificável mundanalidade. ‘Carne’ quer dizer relatividade, nulidade, contra-senso, falta de sentido.” (BARTH, 2002, pp.408)
Cabe registrar que a melhor solução para a interpretação do sentido da carne no pensamento do Apóstolo Paulo continua sendo aquela formulada por Santo Agostinho, Bispo de Hipona, para quem a carne foi interpretada de forma holística para significar o homem em sua totalidade:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]De acordo, porém, com o sentido da Escritura, uns e outros vivem segundo a carne. Com efeito, não chama carne apenas ao corpo do animal, terrestre e mortal, como quando diz: Nem toda carne é a mesma carne, mas uma é a carne do homem, outra a da besta, outra a das aves e outra a dos peixes, mas a essa palavra dá outras muitas acepções. Algumas vezes chama carne ao homem, quer dizer, à natureza humana, tomando o todo pela parte. ”( S. AGOSTINHO, 1990, pp. 132[/blockquote]
Nunca foi simples para o homem comum que fora atraído para as comunidades cristãs pela mensagem dos evangelhos de Cristo apreender tão complexa construção teológica. Para este, se o corpo era em si mesmo uma natureza fraca, pecaminosa, estava aprisionado a sombra de uma força poderosa,o poder da carne. Todavia, a fragilidade física do corpo, sua propensão à morte e o inegável pendor de seus instintos para o pecado representado pela sexualidade serviram a Paulo como uma metáfora da natureza humana pecaminosa rebelada contra a obediência exigida por Deus:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Nas cartas de Paulo, o corpo humano nos é apresentado como numa fotografia batida contra o sol: trata-se de uma silhueta negra cujas bordas estão inundadas de luz. Perecível, fraco, ’semeado na desonra’, ’carregando sempre a morte de Jesus’ em sua vulnerabilidade aos riscos físicos e à amarga frustração, o corpo de Paulo era realmente um ‘vaso de argila’. No entanto, já refulgia com certa dose do mesmo espírito que erguera da sepultura o corpo inerte de Jesus: ’para que a vida de Jesus possa manifestar-se em nossa carne mortal.”AGOSTINHO, 1990, pp..49)[/blockquote]
Paulo escreveu sobre o casamento e a sexualidade em diversos textos de suas Epístolas. Destaca-se aqui I Coríntios 7. (S. PAULO,I Coríntios 7:1-6). Nesta passagem, Paulo apresenta a sexualidade como uma concessão divina no casamento, porém estabelece a igualdade entre os sexos nas relações sexuais. Paulo:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Passemos aos pontos sobre os quais me escrevestes. É bom ao homem não tocar em mulher. Todavia, para evitar a fornicação, tenha cada homem a sua mulher e cada mulher o seu marido. O marido cumpra o dever conjugal para com a esposa; e a mulher faça o mesmo em relação ao marido. A mulher não dispõe do corpo; mas é o marido que dispõe. Do mesmo modo, o marido não dispõe do seu corpo;mas é a mulher quem dispõe. Não vos recuseis um ao outro, a não ser de comum acordo e por algum tempo,para que vos entregueis as orações; depois disso, voltai a unir-vos, a fim de que Satanás não vos tente mediante a vossa incontinência. Digo isso como concessão e não como ordem. (S. PAULO,I Coríntios 7:1-6).[/blockquote]
O Apóstolo Paulo, um celibário por opção voluntária, coloca o casamento como concessão divina. E por outro lado, afirma não haver restrições para a prática da sexualidade no leito conjugal. No entanto, o cerne e a novidade deste texto é a igualdade sexual na relação entre os sexos. Marilena Chauí: “O Apóstolo introduz uma inovação sem precedentes, face à antiguidade: a igualdade sexual. Embora diga que a mulher deve obediência ao marido, no tocante ao sexo, a igualdade é a regra”. (CHAUÍ,1991, pp. 91) Fica evidente no pensamento de Paulo que a sexualidade entre marido e mulher é algo que deve ser resolvido entre iguais, sem a interferência de terceiros. A regra de ouro estabelecida pelo Apóstolo dos Gentios para nortear a prática da sexualidade é o respeito mútuo a integridade, as necessidades e limites do parceiro (a).
O século II foi pródigo na representação do corpo humano e da sexualidade. Estes foram considerados como representantes da maldade inerente à natureza humana em sua luta insana contra Deus. Dentre os autores que mais influenciaram o pensamento cristão sobre o corpo e a sexualidade neste período destaca-se Hermas, o pastor, Orígenes e Valentino. Com algumas variações, estes autores construíram seu pensamento a partir da concepção do corpo como mal e conseqüentemente como a genuína habitação do pecado. O pecado passou a ser representado pela prática do ato sexual, inclusive no casamento abençoado por Deus e pela própria Igreja. Estes patriarcas vislumbraram nas concepções paulinas do corpo como templo do Espírito Santo, um objetivo a ser alcançado nesta vida pela abstinência e elegeram a renúncia sexual como método supremo nesta tarefa.
Transformar-se no templo do Espírito Santo torna-se o objetivo do cristão. Para atingir esta consecução, o corpo deve ser sacrificado pela abstinência, pela renúncia sexual, pela pobreza voluntária e pela penitência. Para tanto, o corpo deve ser privado de qualquer atividade sexual: o beijo, o abraço, o ato sexual, o toque de mãos, e até a visão do próprio corpo foram proibidos. Estas concepções foram cristalizadas no gnosticismo e posteriormente no maniqueísmo. O primeiro pregava a salvação através do conhecimento. Para conhecer, isto é, alcançar a gnose, o homem deve trilhar o longo caminho da purificação espiritual. A via da purificação deve começar pelo seu corpo que é considerado mal. O gnosticismo se constituiu numa dissidência do cristianismo e influenciou profundamente as concepções do corpo do segundo século. Na representação dos gnósticos, especialmente de Valentino, o corpo passa a ser considerado como aquele elemento mal necessário para equilibrar a bondade do espírito que nele habitava. O corpo era um elemento absolutamente estranho ao verdadeiro eu. Os gnóasticos não viam oposição entre a luz e as trevas. O gnosticismo acreditava, contudo, na supremacia da luz sobre as trevas, do macho sobre a fêmea e do espírito sobre o corpo. Então, pregarem também sobre a necessidade da superação dos desejos sexuais pela abstinência como forma de purificação espiritual e santificação.
Ainda no II século Clemente de Alexandria apresenta o corpo como um mal necessário e a sexualidade cristã como uma concessão no casamento. Clemente escreve uma obra vasta: Exortação aos pagãos, do Paidagogos, do Stromateis, Miscellanies, A salvação do homem rico, Contra os judaizantes. Do Paidagogos, é um livro de boas maneiras que dá inicio a pedagogia sexual no cristianismo.  Descreve minuciosamente como deve ser o comportamento do cristão à mesa e especialmente à cama. Clemente detalha o que deveria ser permitido ao casal cristão no ato sexual. Peter Brown: “O Paidagogos foi escrito para dizer como cada um de nós, devemos nos conduzir em relação  ao corpo, ou melhor, como regular o próprio corpo”. (BROWN, 1990, pp. 113)
Século III.  Orígenes relacionou sua doutrina da abstinência sexual com a teologiA paulina do corpo como templo do Espírito Santo e do cristão como membro do corpo vivo de Cristo. Na concepção deste, aqueles que subjugam a carne ganham como prêmio a morada de Deus em seus corações, tornam-se o templo do Espírito Santo e nesta condição membros do corpo vivo de Cristo. Orígenes:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Vede agora como tendes progredido desde a condição de ínfimas criaturas humanas sobre a face da terra. Tendes progredido para vos transformardes num templo de Deus, e vós, que éreis mera carne e osso, chegastes tão longe que sois um membro do corpo de Cristo. (ORÍGENES, apud BROWM, 1990,  Ibdem, pp.155).[/blockquote]
Século IV – Desde o final do século III e início do IV século, temos o surgimento dos padres do deserto. A sexualização do pecado e o  controle da Igreja sobre o corpo havia chegado ao auge com o maniqueísmo. Mani, seu fundador, teve aos doze anos de idade em Ctésifon, às margens do Rio Tigre, em 228/9, a primeira de uma série de visões que daria sustentação a sua doutrina. O cerne da sua doutrina é uma visão dualista radical: o bem, representado pela luz, em luta permanente contra o mal, representado pelas trevas. A aplicação do maniqueísmo sobre o corpo afirma que o espírito é bom e o corpo é mal.
Um número cada vez maior de cristãos acreditava que só o deserto era neutro e capaz de domar os desejos pecaminosos do corpo e para lá afluíram. Nos lugares montanhosos fixaram suas moradas. Celas simples e parca alimentação, beirando a miséria, só com o necessário para manter a vida do corpo. O ideal do sofrimento e do sacrifico no Cristianismo foi levado ao extremo. Dentre os padres do deserto que mais contribuíram para o desenvolvimento de uma tecnologia para a mortificação e glorificação do corpo, destaca-se Pacômio. Este, na realidade, desenvolveu os rituais de controle do corpo e dos desejos carnais a fim de chegar à perfeição adâmica, como demonstra o Paralipomena de Pacômios:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Assim irmãos, deixai que a alma ensine a sabedoria a este corpo obtuso todos os dias, ao nos deitarmos à noite, e que diga a cada membro do corpo: ’Oh pés, enquanto tendes o poder de vos firmar e locomover, antes que sejais prostrados e fiqueis imóveis, erguei-vos animadamente para vosso Senhor. ’ Ás mãos, que ela diga: ’ chegará o momento em que ficareis frouxas e imóveis, atadas a uma à outra (cruzadas sobre o peito), (…) e assim, antes que pendais nessa hora, não cesseis de vos estender para o Senhor. ’ (PACÔMIO, Apud BROWN, 1990,  Ibdem, pp. 189.)[/blockquote]
Registra-se, todavia, que o resultado esperado é a absoluta domesticação do corpo humano, como demonstra o chamado Tratamento de Desabituação mediante o qual o asceta arrancava do corpo todos os desejos representados pela sua excessiva dependência anterior dos alimentos e da satisfação sexual. A pulsão sexual era domada e, às vezes, extirpada. No final do processo, o monge adquiria o aspecto gerado pela repressão dos desejos da carne, seja o de alimentar-se, copular, divertir-se ou mesmo rir. O monge ficava domesticado, obediente, manso, auto centrado, com o domínio sobre todas as suas emoções, todos os desejos. A tecnologia adotada neste processo de santificação aparece com toda sua força na Carta a um Amigo de Filoxeno de Mabug:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Aumentai-lhe, se vos aprouver, o jejum, dos sabás, ou a vigília da noite, ou a leitura ininterrupta, e o corpo não adoecerá, pois ter-se-á acostumado a eles. O estômago ter-se-á reduzido(…) as vias sanguíneas ter-se-ão estreitado e só terão exigências moderadas. Os rins terão adquirido sua saúde natural e não necessitarão de muito calor. O muco terá sido retirado de todos os ossos, e em decorrência da pequenez do corpo, eles não serão enfraquecidos ou prejudicados pela vigília excessiva. (MABUG, apud BROWN, 1990, pp.191).[/blockquote]
O quarto século da era cristã é marcado pelo pensamento teológico de Santo Agostinho, Bispo de Hipona. Este, não só constrói as bases para a sistematização da teologia cristã em sua obra como reformula as concepções  sobre o copo e a sexualidade. A obra teológica de Agostinho é vasta. A teologia do corpo e da sexualidade aparece em quase todas e As Confissões,  S. AGOSTINHO(1987) A Cidade de Deus (S. AGOASTINHO,,(1990)  Comentário Literal Sobre Gênesis S. AGOSTINHO(2005)Do Bem Conjugal e da Santa Virgindade, (S. AGOSTINHO, 2000) dedica parte das teses agostinianas a este tema. Em Agostinho, o corpo deixa de ocupar o lugar de lobo mau da espécie, onde o tinham colocado as concepções gnósticas e maniqueístas, para tornar-se parte indissolúvel e importante da pessoa humana. Agostinho percorre um longo caminho de reflexão sobre o corpo, rompe com a tradição dos Pais do Deserto que considerava o corpo e a sexualidade intrinsecamente mal e culmina com o ensino segundo o qual o cristão deve amá-lo e não odiá-lo. Agostinho:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Deixai que eu vos expresse isso ainda mais intimamente. Vossa carne é como vossa mulher (…) Amai-a, repreendei-a; deixai que ela componha um só vínculo de corpo e alma, um vínculo de concórdia conjugal (…) Aprendei agora a dominar o que recebestes como um todo uno. Deixai que ela sofra a escassez agora, para que então possa desfrutar da abundância. ( AGOSTINHO. Apud P. BRONW, 1990, pp. 350.).[/blockquote]
Agostinho reformula a noção de pecado original. Ele desvincula o sexo do pecado original e coloca a vontade humana como o centro da rebelião contra Deus. O que o homem deve controlar é a sua vontade, esta é a fonte de todas as virtudes e todos os males. O pecado original consistiu na desobediência a uma ordem divina: o homem e sua mulher não deveriam comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal conforme Gênesis: “E Iaweh Deus deu ao homem este mandamento: Podeis comer de todas as árvores do jardim. Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás, porque no dia em que dela comeres terás que morrer” (GÊNESIS,  capítulo 3:16-17).
Agostinho escreveu sobre a vida sexual dos cristãos e desloca o foco da abstinência sexual obrigatória, inclusive no casamento, para a abstinência voluntária própria da vocação religiosa. Além da necessidade de procriação, a sexualidade ganha outra função: as relações sociais. A sexualidade deveria pavimentar a estrada da amizade e do companheirismo entre os sexos e servir de modelo para as relações interpessoais. Para o Bispo de Hipona, o ato sexual é anterior à queda. Neste ponto, Agostinho rompe com a tradição patrística e estabelece as condições necessárias para que a cristandade passasse a ver a sexualidade como natural, inerente ao próprio corpo humano e sujeito às leis biológicas próprias Agostinho:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]É verdade haver muitas classes de libido; quando, porém, se diz simplesmente libido, sem mais nada, é costume quase sempre entender-se a que excita as partes sexuais do corpo. E é tão forte, que não apenas domina o corpo inteiro nem só de dentro para fora,mas também põe em jogo o homem todo, reunindo e misturando entre si o afeto e o ânimo e apetite carnal, produzindo desse modo a voluptuosidade, que é o maior dos prazeres corporais. Tanto assim, que, no momento preciso em que a voluptuosidade chega ao cúmulo, se ofusca por completo quase toda a razão e surge a treva do pensamento. (AGOSTINHO, 1990, pp.156)[/blockquote]
Agostinho foi o primeiro a formular uma psicologia sexual da libido quando escreveu sobre a autonomia psíquica da libido como causa da impotência e da frigidez. Com esta proposição, a sexualidade foi efetivamente retirada do eixo puramente espiritual da literatura teológica e posta no âmbito dos fenômenos psicossomáticos. Tanto na impotência, quanto na frigidez, a vontade era escarnecida pelo corpo com a mesma sem-cerimônia do gozo incontrolável do orgasmo, a libido não serve a libido e volta-se contra si mesma num movimento de introversão. Santo Agostinho:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Assim, coisa estranha, a libido não somente se recusa a obedecer ao desejo legítimo de gerar, mas também ao apetite lascivo. Ela, que de ordinário se opõe ao espírito que a enfreia, às vezes, se resolve contra si mesma e, excitado o ânimo, se nega a excitar o corpo. (AGOSTINHO, 1990, pp. 156)[/blockquote]

  1.  As Representações do Corpo e da Sexualidade em Lutero e Calvino

A Reforma Religiosa do Século XVI, considerada a face religiosa do renascimento, privilegiou a leitura dos clássicos: As Sagradas Escrituras do Velho e do Novo Testamento, alçados pelos reformadores à categoria de Palavra de Deus, o registro seletivo dos atos de Deus na História do seu povo, portanto, a única regra de fé e prática. Em última instância, os reformadores Martinho Lutero e João Calvino elegeram São Paulo e Santo Agostinho como divisor de águas para a solução dos problemas teológicos, e, mormente, àqueles relacionados ao corpo e a sexualidade.
O pensamento LUTERO sobre o corpo e a sexualidade encontra-se em seus sermões e suas cartas pastorais e fundamentam-se,  (LUTERO,1995, pp.160-193), sobretudo, na sua interpretação da I Epístola de Paulo aos Coríntios. Quanto ao corpo e a sexualidade Lutero foi generoso para um homem da sua época. O corpo é considerado o templo do Espírito Santo, a morada de Deus. Não existe conflito entre o corpo e o espírito humano: ambos são duas faces de uma mesma realidade, unos e indivisíveis. Martinho Lutero:“Que é o templo de Deus?  Acaso pedras e madeira? Não diz Paulo: É santo o templo de Deus que sois vós?”(LUTERO, 1995, pp. 55) Na concepção luterana a santificação é considerada uma obra da graça de Deus através do Espírito de Cristo. As penitências não são apenas combatidas são consideradas uma afronta a Pessoa e a Obra do próprio Cristo.
Martinho Lutero escreveu sobre a sexualidade a partir da teologia do Apóstolo Paulo e de Santo Agostinho.  Seus escritos destinavam-se a orientar o rebanho protestante que nasceu em torno de suas idéias, contudo, demonstram  um avanço nesta questão: a) Não existe uma pedagogia sexual em Lutero. A questão da práxis sexual, isto é, sobre o que deve ser praticado no leito conjugal, deve ser resolvido pelo casal; b) Lutero não apresenta  nenhuma relação entre o sexo e o pecado original, portanto, não há nenhuma correlação entre a sexualidade e a culpabilidade humana  original; c) A sexualidade é vista como inerente à própria identidade do ser humano, Martinho Lutero:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Por isso, cada qual tem que aceitar o corpo tal como Deus lho criou, e não está em meu poder transformar-me em mulher, e não está em teu poder transformar-te em homem. Tal como fez a ti e a mim, assim somos: eu um homem, tu uma mulher. (LUTERO, 1995, pp. 161)[/blockquote]
d) O sexo é considerado como natural e necessário para homens e mulheres, a sexualidade é decorrente da vontade de Deus para a pessoa humana:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Por conseguinte, assim como não está em meu poder deixar de ser homem, também não estar em meu poder ficar sem mulher. Analogicamente, assim como não estar em teu poder deixar de ser mulher, também não está em teu poder ficar sem homem. Pois aí, não se trata de livre escolha ou decisão, mas de algo necessário e natural: quem é homem tem que ter uma mulher, e quem é mulher tem que ter um homem. (Lutero, 1995, pp. 162).[/blockquote]
e) Homens e mulheres devem se respeitar mutuamente no relacionamento sexual Martinho Lutero:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]E Deus quer que essas boas criaturas sejam honradas e respeitadas como obra divina, e não permite que o homem despreze ou ridicularize a mulher ou a moça. Nem tampouco, a mulher, o homem, mas cada qual honre a pessoa e o corpo do outro como boa obra de Deus, que agrada ao próprio Deus. (LUTERO, 1995, pp. 161-162).[/blockquote]
f) O sexo como obrigação, no casamento, deve preservar seu caráter de ato voluntário e altruísta tanto pelo homem quanto pela mulher:“Aqui S. Paulo instrui os cônjuges sobre seu comportamento em relação aos deveres conjugais e fala do dever de atender aos desejos do parceiro. É portanto dever e, ao mesmo tempo, deve acontecer de voa vontade.”(LUTERO, 1995, pp. 192-193) g) O marido é obrigado pelo matrimônio a garantir e manter o prazer sexual da mulher no leito conjugal e; h) A mulher é igualmente compungida a garantir e manter o prazer sexual do marido; i) Também a mulher tem os mesmos direitos e privilégios sexuais do homem, portanto, deve ser tratada como igual; j) A relação sexual  do casal deveria ser mantido inclusive com arranjos e combinações consentidas para garantir o prazer do parceiro no caso de impedimento grave(LUTERO, 1995, pp. 163-173); k) Deus é misericordioso com os pecados sexuais cometidos no leito conjugal: “Esse dever é a razão por que Deus faz concessões ao estado matrimonial e lhe perdoa coisas que em outras circunstâncias, castiga e condena.” (LUTERO, 1995, pp. 192-193) a reafirmação de que o pecado original não foi de natureza sexual abriu novas possibilidades para a sexualidade no casamento.
João Calvino pouco escreveu sobre o corpo e a sexualidade. A teologia calvinista profundamente influenciada pelos escritos de Santo Agostinho postula que Deus é soberano sobre todo o universo e toda a criação e que o homem foi criado a sua imagem e semelhança. Imagem e semelhança, entendida aqui, em sentido espiritual, ético e moral. O homem reflete em sua natureza, embora decaída, aqueles atributos de Deus ligados à ética e a moralidade tais como o amor, a justiça, a santidade e a autodeterminação. Calvino formulou a doutrina da predestinação segundo a qual Deus escolheu, antes da fundação do mundo, alguns homens para a salvação eterna e outros para a danação.  O homem predestinado para a vida eterna é livre para fazer a vontade de Deus. Esta servidão voluntária  é o sinal e o pressuposto da eleição.
Nesta condição de eleito de Deus, o corpo humano transforma-se no templo do Espírito Santo. No entanto, ao postular o corpo como morada de Deus,a teologia calvinista longe de resolver o problema do corpo cria para o cristão  um paradoxo ainda maior: como resolver o conflito gerado pelos instintos de um corpo naturalmente animal com a necessidade de preservar este corpo como morada de Deus?  Só resta ao cristão calvinista a saída pela ética da via negativa: O corpo torna-se a clausura do cristão, o seu deserto é o mundo, seu corpo, a sua cela.
Talvez seja esta a forma mais vigorosa de repressão que o ser humano engendrou. O cristão calvinista é chamado do mundo pela palavra de Cristo, São Mateus 11:28  Vinde a mim.(S. MATEUS 11:28)E em seguida, é enviado ao mundo pela mesma palavra Marcos 16:15: Ide e pregai. (S. MARCOS 16:15). No mundo, o cristão deve provar a sua predestinação e sua eleição pela rejeição de todas as formas de prazeres mundanos. O sinal da sua santificação é a clausura em seu próprio corpo, pois seu corpo é seu mosteiro. João Calvino:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Por esta razão São Paulo conclui que somos templos de Deus, por seu Espírito que habita em nós (I Coríntios 3; 17; 6:19; II Cor. 2. (…) E o mesmo apóstolo com idêntico sentido, algumas vezes, nos chama templos de Deus e outras templos do Espírito Santo. (CALVINO, 1967, pp. 80)[/blockquote]
Neste contexto, a sexualidade ganha um papel secundário na vida do homem e da mulher: o sexo é permitido, no casamento, como uma concessão divina, um remédio contra a luxúria. Somente no casamento a sexualidade ganha o favor de Deus, sua benevolência:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Agostinho trata do assunto, e por, muito bem, em seu livro das Vantagens do Matrimônio, e às vezes, em outras partes. Pode-se sumariá-lo como segue: o ato sexual entre esposo e esposa é algo puro, é legítimo e santo; porque é uma instituição divina. A paixão incontrolável com que os homens são inflamados é um vício oriundo da corrupção da natureza humana; mas, para os crentes, o matrimônio é um véu que cobre essas falhas, de modo que Deus não mais as vê. (CALVINO, 1996, pp. 204)[/blockquote]
O calvinismo é levado de Genebra, na Suíça, para a Escócia por John Knox e posteriormente, chega à Inglaterra. A Inglaterra aderiu ao movimento  protestante  para resolver os problemas políticos e sexuais de Herinque VIII. Este percebeu no movimento reformado a oportunidade que lhe faltava para se livrar do domínio de Roma e legitimar suas atrocidades sexuais contra as mulheres, suas esposas. A Inglaterra purgou os seus pecados por meio da criação da versão mais radical que se tem notícia do protestantismo: o puritanismo. O éculo XVII viu surgir, a partir da vertente escocesa do calvinismo, o movimento puritano. A característica central deste movimento foi  o conversionismo que deu origem as missões modernas. O pregador puritano acredita na necessidade da conversão do pecador a Jesus. A conversão é definida nesta expressão religiosa como o abandono do mundo e a volta para Deus. Servir a Deus, viver para a sua glória torna-se o único objetivo do cristão nesta vida. A conversão deve ser marcada por uma profunda e radical mudança de vida da parte do convertido para expressar a consecução deste objetivo.
O calvinismo ensina que a queda afetou a natureza humana como um todo comprometendo especialmente a volição. A vontade humana tornou-se o centro do conflito espiritual: de um lado, o espírito querendo voltar para Deus e, do outro, o corpo, rebela-se e volta-se para o mundo. O mundo é entendido como a ordem de coisas que se rebelou contra Deus. I João: “Nós sabemos que somos de Deus e que o mundo inteiro está sob o poder do Maligno.” ( I JOÃO 5:19) Para solucionar este conflito o movimento puritano identificou a mente humana como o centro da vontade e o corpo como templo do Espírito Santo. E postulou que “A mente vazia é a oficina de Satanás”. “(Ad tempora)”.Ou, dizendo de outra maneira, é preciso ocupar a mente humana para fugir à tentação do Diabo. Para ocupar a mente, o homem deve gastar todas as suas energias no trabalho: trabalhar, trabalhar, trabalhar… Trabalhar até a exaustão para a glória de Deus. Este é o caminho da santificação puritana. Só resta ao corpo o ideal da ascese para se chegar a este destino: Marilena Chauí:”Ascese quer dizer: limpar-se, purificar-se por meio de exercícios físicos, morais e espirituais que liberam a alma das impurezas e imundícies do corpo, particularmente daquela que está na origem de todas as outras: o sexo.” ( CHAUÍ, 1991, pp. 149-150)
Nas colônias da Nova Inglaterra, os Estados Unidos, o protestantismo puritano criou raízes e produziu seus frutos: o corpo como templo do Espírito Santo de São Paulo, Santo Agostinho, Martinho Lutero e João Calvino se transforma pelo espírito puritano em mero instrumento de trabalho; a mente humana, centro de atuação do Espírito Santo na vontade do cristão, transmuta-se em oficina de Satanás; a sexualidade como
expressão da identidade humana e das bençãos de Deus converte-se em um mal necessário, perigoso, a ser purificado pelo trabalho e; o mundo, palco da atuação de
Deus, vira o lugar privilegiado de atuação do demônio. A santificação já não mais significa viver para Deus e sim fugir do demônio e do mundo, o lugar da sua habitação. Evitar o demônio é deixar para trás todos os prazeres mundanos e buscar somente aqueles prazeres espirituais permitidos pela pregação puritana: o serviço divino, o jejum, a oração, a evangelização e é claro, o trabalho, como observou Max Weber, na Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo.(WEBER, 1994)

  1. As Representações do Corpo e da Sexualidade no Protestantismo Brasileiro

Boanerges Ribeiro (RIBEIRO, 1973) e Antonio Gouvêa Mendonça  (MENDONÇA, 1995) observaram que o protestantismo brasileiro em suas origens históricas vem de duas matrizes: a) O protestantismo de imigração formado por imigrantes alemães e ingleses de confissão Luterana e Anglicana, especialmente nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina; b) O protestantismo de matriz puritana, de missões, de natureza conversionista abrange os presbiterianos, metodistas, congregacionais, batistas, e etc.  Este autor acrescenta uma outra vertente, ainda não pesquisada no Brasil, e que se encontra de igual modo na gênese do protestantismo brasileiro: é aquele protestantismo de exílio nos quais se incluem o presbiteriano sulista, norte americano, que vieram para  Campinas, Santa Bárbara do Oeste e Americana após a guerra da secessão. (GOLDMAN, 1972).
Boanerges Ribeiro e Antonio Gouvêa Mendonça consideram como constituintes do protestantismo brasileiro aquelas denominações formadas pelo chamado protestantismo histórico: luteranos, presbiterianos, anglicanos, congregacionais, e etc. É necessário considerar  todavia, que a partir do primeiro quartel do século XX, este protestantismo ganha novos atores com o advento do pentecostalismo, a versão moderna e emocional do protestantismo. Já o neopentecostalismo, surge na segunda metade do século XX como dissidência do primeiro.  A semelhança de Pierre Bastian (BASTIAN, 1994) e Willian Read (READ, 1970) este autor considera que o termo protestantismo brasileiro deve ser bastante elástico para abarcar  os pentecostais e neopentecostais, posto que considere que são todos oriundos do mesmo útero gerador: o protestantismo puritano norte-americano.
Este protestantismo de raiz missionária norte americana, é hegemônico na constituição do protestantismo brasileiro. E em solo pátrio produziu uma religião formal, legalista, tristonha, depressiva, cuja maior característica é a importação de paradigmas comportamentais do modelo cultural dos Estados Unidos. The way of life torna-se o paradigma do ideal a ser atingido pelo crente (como é reconhecido o protestante no Brasil) e produz como conseqüência aqueles comportamentos estereotipados, como por exemplo, a ética da via negativa, quando o crente se torna conhecido exatamente pela lista de coisas que ele não faz: não bebe, não fuma, não dança, não joga etc. E o ódio e rejeição, quase que absoluta, a todas as expressões da cultura brasileira, como observado por Antonio Mendonça e Prócoro Velasques Filho(MENDONÇA E VELASQUES FILHO, 1990) E a total condenação de toda e qualquer expressão corporal nos cultos e fora destes e, particularmente, o anátema daqueles aspectos ligados ao corpo e a sexualidade brasileira como a sensualidade, o erotismo, o chamego e xodó.
Considerações Finais
Reina o silêncio sobre o corpo e a sexualidade no protestantismo brasileiro. Quase nenhuma pesquisa foi publicada até hoje sobre este tema. As obras publicadas em sua grande maioria são traduções de títulos norte americanos. Estes são oriundos daquela vertente do protestantismo vinculada ao movimento puritano. Convém destacar que a pedagogia sexual veiculada nesta literatura não é apenas lida pelos protestantes, é utilizada, principalmente, como ferramenta de trabalho pelos chamados conselheiros cristãos. Estes são geralmente clérigos e leigos bem intencionados, porém sem nenhum preparo nas ciências medico – psicológicas para atuar nesta área. A tônica destes livros e seus conselheiros é a confissão. Estes conselheiros são elevados à categoria de novos confessores do protestantismo. Daí a escassez de pesquisas e publicações que aponte algumas questões relevantes tais como: qual a relação da aplicação destes procedimentos com a produção de ansiedade, de angústia, e mesmo de doenças mentais? Qual a relação destes procedimentos com os resultados prometidos pelos gurus da sexualidade protestante? Quais as relações da ética puritana adotada nestes manuais para a potencialização da culpabilidade humana? Etc. Rosa:
[blockquote author=”” link=”” target=”_blank”]Há diversos tipos de vida religiosa: alguns regressivos e patológicos e outros mais progressivos e formadores de personalidades sadias. Há doentes em que os delírios de obsessão do pecado servem para condenar definitivamente todos os atos de origem sexual (mulher que se sente prostituta se obter prazer sexual; homem que transforma a esposa em prostituta). Há, basicamente, três tipos de concepção da vida religiosa: a legalista, que é essencialmente proibitiva e que corresponde a uma estrutura neurótica de perfeccionismo em ligação com o rigor do superego bíblico; a religião de dependência, que corresponde a uma estrutura neurótica de medo da liberdade e de conflitos com tendências negativistas e compulsivas; e, por fim, a religião do espírito, em que a crença religiosa, longe de ser sufocante ou dissociadora, unifica, todavia as tendências, os sentimentos, as idéias e centraliza a atitude do indivíduo no amor pelo próximo. (ROSA, 1985, pp.189).[/blockquote]
O cerne do pensamento reformado sobre o corpo repouso no axioma paulino do corpo como templo do espírito santo. A teologia do corpo como templo do Espírito Santo e suas implicações para uma ética da sexualidade e mesmo da saúde é praticamente desconhecida dos arraiais protestantes. Simei de Barros Monteiro, realizou uma pesquisa sobre os conceitos fundamentais expressos nos cânticos das igrejas evangélicas no Brasil. Nas letras compiladas por esta pesquisadora, nas trocas lingüísticas da hinologia cantada pelas grandes denominações evangélicas nacionais encontra-se apenas um hino que apresenta o corpo como templo do Espírito Santo numa perspectiva, que a autora classificou como libertadora. Simei Monteiro:

Tu nos deste este corpo que é teu templo,

Não queremos destruí-lo;

É tão bom senti-lo livre assim,

Sem amarras e mazelas,(…)

Tu nos deste este corpo para a vida,

Não o queremos para a morte,(….)

Tu nos deste este corpo para a glória

E a perfeita plenitude;

Não permita que ele seja

Negação da humanidade

Mas que em Cristo restaurado

Nos revele a tua imagem.

( Novo canto da Terra 187). (MONTEIRO, 1991, pp. 161).

Este cântico, único em todos os sentidos e não apenas pela expressão do seu conteúdo pode significar uma mudança de paradigma na compreensão do corpo nas comunidades protestantes. Está evidente que este hino canta a libertação do corpo: este foi destinado por Deus para vida e não para a morte (v. 5 e 6); para a glória; e a perfeita plenitude (v. 7 e 8). Estes versos parecem traduzir em sua essência o sentido do corpo como templo do Espírito Santo. Registra-se, contudo, que ainda se não tem notícia de estudos sobre as implicações deste postulado teológico para a expressão da sexualidade. Este Cântico, todavia, se constitui numa exceção. Na prática, o que se encontra é um silêncio absoluto sobre o corpo e a sexualidade humana na produção musical e teológica do protestantismo brasileiro. Este vazio é preenchido com a importação de uma ideologia sobre o corpo e a sexualidade cuja tônica tem  sido apresentar o corpo como mau e perigoso para a vida espiritual.
O corpo como templo do Espírito Santo foi substituído pelas concepções do corpo como a morada do demônio e, no mais das vezes, como um mero instrumento de trabalho. A sexualidade como expressão da identidade humana e das benções de Deus é representada como um mal necessário a ser domesticado. Observa-se que na literatura pesquisada, aquelas representações de algumas correntes dissidentes do cristianismo que surgiram entre II e o IV século tais como o gnosticismo e o maniqueísmo encontram-se vivos e ativos nestas representações.
A guisa de conclusão, o presente trabalho demonstra que se faz necessário desenvolver e aprofundar pesquisas sobre o corpo e a sexualidade no protestantismo brasileiro para apontar caminhos que considerem a sexualidade como inerente  própria identidade do ser humano sem desvincular a prática sexual desta identidade e represente o homem em sua totalidade no contexto da cultura brasileira que incorpore nas relações sexuais, palavras como erotismo, xodó, chamego, carinho, comunhão de espíritos, de corpos e de mentes. A fim de atingir este objetivo é necessário pesquisar também as representações sociais dos crentes e compará-las com aquelas veiculadas na literatura protestante sobre o assunto.
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[1]  Teólogo, e psicólogo e professor da pós-graduação em Ciências da Religião (Makenzie).

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